domingo, 7 de março de 2010

Quando Setembro Vier - Laurindo Junqueira Filho

Quando setembro vier

Campinas, 7/3/2010

Não acho que Serra esteja indeciso, não. Está, ao contrário, muito certo em sua demora. Acho mesmo que ela seja calculada. Não compartilho com outros o temor quanto ao atraso de Serra em se lançar candidato. Nada seria mais equivocado que responder à provocação de Lula e Dilma, que desde dezembro, insistem em guerrear contra... ninguém.

Morro, montanha e serra são quase sinônimos e não creio que a montanha deva ir até Maomé, neste instante... Creio mais que fogo de morro acima e água de morro abaixo ninguém segura.Valho-me dos ensinamentos que recebi dos meus avós russos, sobre as memoráveis campanhas em que seu povo derrotou, ao longo de três séculos, primeiramente os então todo-poderosos suecos e, depois, Napoleão e Hitler. Imortalizada por Prokofiev em sua obra musical Alexandr Nevsky, a derrota sueca ocorreu ao ter a sua cavalaria mergulhada nas águas geladas de um rio, coberto por uma fina casca de gelo, que, derretida pelo peso e pelo calor adventício do fim do inverno, cedeu ao peso e levou todo o exército para o fundo. A derrota de Napoleão foi imortalizada por Tchaikovsky, também numa obra musical – “1812” -, que relata como os marechais franceses perderam 600 mil dos 700 mil soldados com que invadiram a Mãe Terra dos russos. E, finalmente, Hitler, que, com sua blitzkrieg, julgava poder derrotar esse povo em apenas três meses e gastou três anos para ver seus exércitos voltarem escalpados até Berlim. Coube aos russos, com enorme coragem, disposição de luta e maestria militar, usar o seu campo de luta próprio e o tempo que lhes era mais tempestivo – e não o campo e o tempo do inimigo – para vencer as três guerras famosas.
Sem dúvida, também Serra joga um jogo perigosíssimo, parecido com o dos comandantes russos nessas campanhas. Mas se esses comandantes obtiveram os sucessos mais estrondosos que a história da guerra já registrou, por que teríamos nós razões bastantes para contestar a estratégia e duvidar do acerto de Serra?De fato, foram vários os generais russos que comandaram vitórias estonteantes sobre cada um e sobre todos os invasores mais famosos da história mundial recente, simplesmente se valendo... da mesma estratégia que ora aplica Serra sobre seu adversário. Serra, com muita coragem e disposição de luta, aguarda o Inverno chegar.

Lula e Dilma, afoitos, insistem porque insistem em abreviar o combate tentando trazer Serra para o seu terreno e buscando impor o ritmo e o tempo que lhes é melhor. Por isso eles anteciparam a campanha e provocaram Serra a mais não poder, para que ele aceitasse combater antecipadamente. Lula se pela só com a idéia de perder a guerra e acredita que quanto mais longa a guerra, mais favorável lhe poderá ser o resultado. Afinal, eles está no poder e conta com recursos significativos de aprovação ao seu governo e também de dinheiro para derrotar Serra. Quanto mais longo for o combate, mais fácil será eleger Dilma. Lula poderia, se Serra entrasse no seu engodo, lutar no terreno que mais lhes é propício, durante o tempo que mais lhes convém e no momento que lhes é mais oportuno.

Para Serra, ao contrário, como para os generais russos que conseguiram derrotar os suecos, os franceses e os alemães, é melhor que o inimigo se esfalfe ao tentar conquistar território. É Dilma quem tem que se fazer conhecida e subir nas pesquisas. E Lula gastará muita munição, muito alimento e muita energia para fazer Dilma chegar até perto de Moscou, ou melhor, de Serra... Mas, quando o Inverno chegar, quem terá forças descansadas, alimentos frescos e munição à beça será Serra. Dilma estará sozinha na frente de batalha, longe de seu esteio-mór, sua fonte de abastecimento e inspiração, que é Lula. A “logística” política de sua campanha, quase toda baseada em Lula, estará muito longe das fontes de suprimento. Lembro-me da frase de um amigo íntimo de Lula: “Lula elege até uma poste. É só ela parar de abrir a boca!”.

E se Lula tiver que vir ajudá-la, terá que abdicar do reino do Brasil, deixando-o nas mãos do alquebrado Vice, ou, então... de Sarney. É arriscado até mesmo pensar nisso porque poderá lhes custará caro, muito caro.

Por que Serra temeria que sua adversária se aproximasse “tanto” dele? Quem disse que as pesquisas publicadas estão realmente corretas? E se estiverem, que mal há em iludir Dilma deixando-a aproximar-se do carro-chefe, monitorando-a atentamente pelo retrovisor, fazendo-a agir afoitamente e esfalfando-a diante da ilusão de poder alcançar o coelho que lhe vai à frente? Parte da sua artilharia estará fora de combate, a partir de agora.

Claro! Serra não agirá assim até o fim da campanha... Dilma poderá, realmente, alcançá-lo algum dia. Afinal, Lula tem (tem mesmo?) uns 80% e, se conseguir transferir uns 28% a 30%, isso já será muito. Caberá a Dilma ir buscar a diferença por si própria... E isso tem se mostrado muito difícil, apesar de ela estar em campanha há muito tempo. Não fora isso, Lula não teria enchido a cara em Recife, a ponto de ter que se internar no INCOR com quase-coma alcoólico, quando soube que Dilma não havia ultrapassado Serra na virada do ano, como pretendido por Duda Mendonça e João Santana.

Quanto mais prolongada for a guerra, mais o Lulinha paz-e-amor da esquerda, agora mui amigo de Fidel, poderá transferir votos para a Dilminha guerrilheira. Se Serra encurtar a campanha, como vem fazendo, faltará tempo para o PT executar a sua estratégia, no campo escolhido por Lula e no tempo que lhe é tempestivo. O que Serra está fazendo é atrair Dilma e Lula para bem perto de Moscou e deixando a batalha final para quando o inverno chegar.

Lula e Dilma estão gastando todos os seus trunfos agora. Já falaram muito do PAC 1 e do PAC 2. Já esgotaram o Pré-Sal. Já ampliaram o Bolsa Tudo a mais não poder. Do lado de Serra, Lula e Dilma esperavam que as águas não só de janeiro, fevereiro e março, mas também as de outubro, novembro e dezembro, minassem Serra. E Serra sequer molhou sua galocha. Sobrou prá Kassab, mas não para ele. Esperavam que Serra fizesse todas as inaugurações a que tem direito. E Serra ainda nem começou (é verdade que as obras estão atrasadíssimas e causando muito estrago eleitoral...). O PT e a PF esperavam que Ieda Crucius, Pavan, Beto Richa, Arruda e Kassab contaminassem a imagem de Serra. E nada! Nem gripado Serra ficou. Serra resistiu até agora.

Duda Mendonça tem aquela estratégia manjada: quem está no alto do coqueiro, tende sempre a cair. Como bom bahiano, que se deita na rede pendurada entre dois coqueiros, desde bem cedinho, prá ficar mais tempo sem fazer nada, Duda sabe que é lá no alto do coqueiro que balança mais e é lá mesmo onde é imensamente difícil subir um único pontinho percentual. Duda chama de “alto do coqueiro” os 38% ou 40% de ótimo+bom, que é o que Serra tinha há bem pouco tempo. Nessa estratégia Dudística, Dilma iria subindo coqueiro acima, enquanto Serra desceria célere coqueiro abaixo, passando para o eleitorado a impressão de cavalo ganhador. E os dois se encontrariam juntinhos na virada do ano. Lula teria o desejado presente de Natal e um feliz Ano Bom.

Mas Serra não caiu e Lula não teve o presente que queria. E por isso encheu a cara no Recife, de tão nervoso que ficou.

Serra tem que demorar o bastante até que sinta Dilma fungando na sua careca. Tem que deixar o retrovisor embaçar e só aí Aécio entraria em cena. Dilma não sabe ainda a quem combater, já que os dois inimigos estão ocultos, como os russos das batalhas gloriosas. A guerra que Serra joga é de guerrilha e isso é tudo o que a guerrilheira Dilma não queria. Lula desejava a blitzkrieg de Hitler, com quem, aliás, vem se parecendo cada vez mais. Mas Serra foi-lhe dando a impressão de estar fugindo ao combate, retirando-se cada vez mais para o terreno que lhe é próprio e deixando o bom combate para o momento que lhe é mais propício.

Aposto que, quando setembro vier, Dilma sentirá um friozinho danado. E Duda Mendonça, bahiano dos bons, que gosta de briga de galo e não de galinha, não gosta nadinha de frio.

Laurindo Junqueira Filho